segunda-feira, 15 de junho de 2009

Lua

Lua negra
Lua azul
Lua cheia

Peixe lua
Deusa mãe
Mater Lilith
Toda Lua eu sou.

LILITH, A SENHORA DAS TREVAS

Prima entre pares
com Adão por companhia
fui expulsa do paraíso
pela minha rebeldia.

Sucedeu-me Eva
a submissa
que Deus criou
por cobardia.

MUTILAÇÃO

Esta noite sonhei
que cortava as pontas dos meus dedos
à tesourada.
.
Tesoura afiada
cortava com mestria
de um só golpe
um a um
primeiro a esquerda
depois a direita
com igual sabedoria.
.
Tu pegavas em bolas de algodão
que embebias em alcool
e calcavas
um após outro
os meus dedos mutilados.
.
Vi-me a gritar e despertei.
.
Olha o que estou a fazer às minhas mãos!
.
Faltava-me ainda cortar um dedo.
.
Lilith

ASSOCIAÇÃO LIVRE

Pedra, casa, ninho, poiso.
Coisa, merda, astúcia, horror.
Ardor, amante, amor ardente.
Fulgor, valente, farsante, potente.
Temor, angústia, amargor é dor.
Vida, morte,
morte sem vida.
Amor, estupor,
gestos mortais, funestos, fatais.
Penso, ranço, lanho, manso.
Fito, oiço,
gozo, gonzo,
manhoso, ranhoso, pastoso,
sebento, rafeiro, ardiloso, matreiro.

AMOR IMPERFEITO

A um amor que não serve devia-se deixá-lo morrer à míngua. Levá-lo para o deserto, extirpar-lhe o coração e esvaziá-lo de toda a semente. E, se ninguém o reclamasse, deixá-lo a apodrecer nas escaldantes areias. Abutres bicavam-lhe os olhos, vazando-os das órbitas. Zás! Humores e ligamentos esparramando-se pelos dois lados do crânio.
Fazer um pacto com Hades e entregar-lhe a minha vida em troca desse mal de amor. E rezar, rezar somente, para que viesse Caronte e o levasse sem demora.
No final, da carne defunta, restaria apenas uma carcomida carcaça.

SOMBRAS

Fere-me a vista a luz negra
mais brilhante que o sol
revolvendo a escuridão.
.
Doem-me os dentes de raiva
da raiva de não saber
como todos os demais
ser feliz sem perceber.
.
Lilith

LUA NEGRA

Associada a Lilith, a primeira mulher junto com Adão, representa o centro luminoso do ser, o intangível e a hiperlucidez dolorosa pela força da intensidade.

AUTO DE FÉ - de Manuela Amaral

Não me arrependo dos amores que tivedos corpos de mulher por quem passei
a todos fui fiel
a todos eu amei
Não me arrependo dos dias e das noites
em que o meu corpo herói ganhou batalhas
A um palmo do umbigo eu fui primeira
a divina
a deusa
a verdadeira mulher --- a sem rival.
.
Amei tantas mulheres de que nem sei o nome
eu só me lembro apenas
de abraços
de pernas
de beijos
e orgasmos
E no amor que dei
e no Amor que tive
eu fui toda mulher --- fui vertical.

domingo, 14 de junho de 2009

ANTRO DE PERDIÇÃO
"Numa ânsia tresloucada de lhe dar todo o prazer, parto em busca do seu segredo. Sob a leve pressão dos meus dedos a sua clitóride endurece. Deslizante, deslizo para um interior de um vaso repleto de sémen, que me engole viva. Oiço um longo gemido de satisfação. Só há um modo de responder: penetrar mais fundo. No mais recôndito lugar, eis que os meus dedos descobrem dios montinhos apartados por um vale.
Sem que o pressentisse, ela investiu com redobrado vigor dentro de mim. Ordenhando-me como a uma cabra no seu pasto favorito, todo o meu corpo, sacudido por águas diluvianas, estremecia com violência. Insolente, ela faz-me doer, mas a minha boca, enlouquecida, continua a dilatar-se.
Exausta, incapaz de fugir, imobilizo-me. Ela mexe, remexe; passeia-se num bosque às primeiras horas da manhã, quando o sol ainda é manso, em busca de improváveis espaços.
Enquanto quase me deixo matar, a minha amante deleita-se. Sem possibilidade de suportar mais as suas investidas sem me dissolver, imploro-lhe que se venha.
--- Fica quietinha --- diz-me ---, quero aproveitar ao máximo todo o prazer que me dás.
A seguir, consola-me: --- Está quase...
Passa uma eternidade. Os meus dedinhos, martirizados, começam a sentir minúsculas bolinhas: Nephentes contrai-se, aperta-me, afrouxa, torna a contrair-se, esmaga-me as falanges. Por fim, libertando um só e duradoiro grito de êxtase, a mulher pega-me no pulso e retira-me de dentro de si.
Tomada por um frenesi de fazer inveja ao Demo, revira-me e coloca o meu corpo ao seu jeito: a posição mais humilhante que conheço. Assim, de rabo espetado no ar, de olhos cerrados e incapaz de raciocinar, vejo-a extrair do seu âmago um favo de mel, com o qual me irriga, sarando as minhas feridas.
De súbito, partindo do clitóris, sinto uma descarga que se propaga em vagas de rítmicos espasmos. Todos os músculos do corpo se me retesam e numerosos estremeções me abalam. Um instante insuportável de assombrosas explosões atravessa-me em todos os sentidos. Lucrécia enfia a língua no meu ouvido e diz-me que quase lhe parto os dedos. Como uma cabrita a copular no alto de um penhasco, desfaço-me em puro gozo. Vou explodir em lava ardente nos confins do além-mundo.
Sob a pele, em chamas, o meu pobre coração bate descompassado e a língua enrola-se-me na boca. Sei que estive à beira da morte.
Devagar, muito lentamente, a bolha de ar quente que nos envolvia vai-se esboroando, dispondo-nos ao merecido repouso. Mas, consumindo-nos a carne em picadas intensas, o animal continua à espreita
Lá fora brilha o sol de Inverno."
.
Lilith

UMA HISTÓRIA DE ENCANTAR


Duas mulheres, uma grande cama redonda de aluguer na suíte de uma residencial, o sol intenso de uma tarde de Verão iluminando o espaço e muito, muito desejo.
Vá lá, dá-me a tua ratinha...
Não gosto que fales assim. --- Respondi, fingida.
Numa réplica vertiginosa, ela desvairou-me.
Não gostas? Claro que gostas, minha putinha atrevida…
Fez uma pausa, olhou fundo dentro dos meus olhos e estreitou-me ao peito, dizendo:
Sabes, no século XII, era eu um Cruzado da Guerra Santa quando tu, vivendo numa casinha de telhado de colmo, te apaixonaste perdidamente por mim. Ainda me lembro do lugar.
Beijando-me demoradamente as pálpebras, cerradas de ilusão, e rodeando o meu pescoço com as mãos, Lucrécia ia recordando o nosso passado longínquo.
Parei à beira do lago, para matar a sede ao meu Ginete Andaluz, quando te avistei, tímida, a espreitar-me.
Tu eras uma pobre e linda camponesa, cujos pais tinham morrido com as febres. Quando me sentias, o cavalo galopando ao teu encontro, saías para o terreiro estremecendo de paixão. Sem pejo, entregavas-te a mim como nunca outra mulher se me entregara. Eu tomava-te o corpo e a alma, compreendes, e de corpo e alma o fazia.
Sim, naquele preciso instante eu conseguia compreendê-la.
No descanso das batalhas sonhava contigo, e acordado, ansiava a hora de ter-te novamente entre os meus fortes braços.
Eu estava deslumbrada.
Lembras-te das cantigas de amigo que cantava para ti?
Sim, lembro. --- Respondi, enfeitiçada.
Daquela última vez em que parti para Jerusalém e já não regressei, tu ficaste destroçada. Mais só e desamparada do que nunca, morreste, muitos anos depois, de amor e solidão. Jamais desejaste outro bem-querer porque, à noite, nos teus sonhos, era eu quem estava no leito ao teu lado.
Eu sei, não passo de uma pobre camponesa, apaixonada por um Cruzado.
Morri naquela guerra.
Pressentindo que a grande revelação estava prestes a dar-se, aninhei-me mais no seu colo.
Passaram-se muitos séculos desde que nos encontrámos pela última vez. Agora, que te reencontrei, levo-te comigo ao início dos tempos, por isso é que nos consumimos a fazer amor.
Alucinada, sobressaltei-me. De súbito, arrepanhando o meu sexo, ela revolveu-me as entranhas com a mão toda, o que me desencadeou instantaneamente um misterioso cântico de águas subterrâneas. Devassada por uma garra que me puxava de encontro ao seu peito forte e largo, das paredes do meu útero escorria uma seiva interminável.
Esfregando-se-me nos seios e no ventre encharcados, ela revelava-se não um “Cruzado”, mas um destemido guerreiro árabe.
Sorvendo, sôfrega, o néctar que de mim brotava, inesperadamente puxou-me pelos cabelos e levou a minha boca ao seu sexo, escancarado.
Oh! Não! Não aguento mais. Vem-te. Por favor, vem-te... senão eu morro a esvair-me.
Torturando-me, Lucrécia respondeu:
Espera. Deixa-me gozar…, eu gosto de estar dentro de ti a mugir-te, minha vaquinha. Dá leitinho, vá…, dá leitinho à mãe.
Ai que me estou a vir! Ó Deus, toma… bebe. Bebe tudo…, é tudo para ti…, tudo para ti… Han…, han…, hum…